quinta-feira, 11 de junho de 2009

Nem tudo é o que parece

O vídeo abaixo mostra a travessia da ponte que nos separava da cidade de Poço das Trincheiras, que fica no sertão de Alagoas. Um lugar daqueles bem característicos, que também poderia ser cenário de muitos filmes que se passam no sertão nordestino (disse “também” porque a última cidade em que trabalhamos foi Cabaceiras – PB, onde foi gravado “O auto da compadecida” e mais de 20 outros filmes). A pequena comunidade se situa entre um grande – e lindo!- monte e um rio, bem caudaloso nessa época de muitas chuvas, mas que em grande parte do ano fica seco.
Nessa região as chuvas não causaram tanta destruição como em outras partes do nordeste neste ano, mas muitas barragens tiveram que abrir algumas comportas e o aumento dos rios impediu a ligação entre alguns locais deixando muitos alunos sem poder ir às aulas ou trabalhadores aos seus serviços.
Desse modo sabíamos que haveria grande chance de dormir na comunidade se o rio subisse um pouco mais, por isso já nos preparamos com alguma muda de roupa.
No final deste primeiro dia encontrei com meus amigos na praça. O calor estava enorme e uma cervejinha gelada parecia uma miragem depois de um dia de trabalho. Ao pegar meu copo no pequeno bar no meio da praça – que me lembrava um trailer – o rapaz me perguntou:
- Algum de vocês toca violão?
Geralmente nos consideramos garimpeiros de locais para se fazer um lual. Como é difícil conseguirmos tempo para visitar as bonitas cidades por onde passamos durante o dia é de noite que temos chance de ir para alguma cachoeira, rio, ou qualquer lugar onde o contato com a natureza seja uma dádiva para nós que vivemos em meio a tantos prédios e cimento.
Eu disse que tocava um pouco e o ouvi respondendo que então pegaria um violão para eu tocar com a “rapaziada” ali do lado.
Olhei e vi a “rapaziada” tão “alta” que pareciam estar flutuando ao lado do bar. Pensei na furada em que poderia estar me metendo. Já tive situações em que toquei com uma galera completamente “breaca” e não é fácil. Geralmente pedem músicas que você não sabe, reclamam brincando que não toca nada, não curtem as poucas que você tenta tocar... Enfim, olhei para meu copo de cerveja geladinho e pensei como faria para continuar apenas na companhia agradável dele.
Sentei por 2 minutos e ouvi:
- Ô! Olha aqui! – era o rapaz de dentro do bar, erguendo triunfante um violão, como se fosse um troféu.
Eu, em minha involução, disse aos amigos que tocaria apenas músicas em inglês e de rock, esperando que eles não curtissem e me liberassem rapidamente. Se tocasse um “Raul Seixas” ou um “Legião Urbana” estaria perdido: só sairia de lá depois das 5 da manhã!
No meio da grande roda que ali havia peguei o instrumento, me sentei e os adverti das poucas músicas e do único estilo que conhecia. Para minha surpresa todos sorrindo, completamente simpáticos, disseram para eu mandar bala, queriam apenas me ver tocar.
Comecei com “Plush”, música dos Stone Temple Pilots e dei risada quando todos acompanhavam com palmas e um no meio cantarolava letras enroladas, mas que mostrava que conhecia a música. Terminei – surpreso! – diante de palmas. Comecei a mudar minha opinião e continuei com “Black” do Pearl Jam, incrivelmente mais um sucesso de audiência. O pessoal era tão gente boa que fiquei com vergonha do conceito que tinha feito antes.
Um homem que estava por ali e tocava com eles antes de eu chegar me pediu para deixá-lo tocar uma música, o que prontamente atendi. Disse que tocaria uma que ele mesmo havia composto e começou. Foi uma música tão bonita que chegou a emocionar, mesmo, sem exagero. Música com originalidade e qualidade, que não só não perde nada para músicos de sucesso que estão por aí como é melhor do que a grande maioria de coisas que o rádio nos empurra ouvido a dentro.
Tocou mais umas 3 músicas próprias e ficamos – eu e alguns amigos da turma que ajudavam a encher a roda naquele momento – impressionados com o som. Newton, deve ter em torno de 40 anos, mais um talento por esse Brasil a fora.
Tudo estava tão agradável que quando me passou o violão toquei Raul e Legião, que tanto me pediam, desmascarando a mentira deslavada que contei no começo. A noite iria longe, ainda mais quando nos apresentaram Doca, um sanfoneiro gente boníssima que trouxe, além da sua amada sanfona, um triângulo e uma zabumba e o forró começou muito animado.
E a noite realmente foi longe; dormimos pouco e acordamos cedo para o trabalho na escola. Mas um daqueles dias em que não acordamos nem um pouco cansados, pensando: “Que noite!”