Conversando com os dentistas da Marinha, colegas de trabalho na região amazônica, a doutora percebia uma certa tristeza. Para pessoas que querem fazer a diferença, é difícil aceitar que, em muitos casos, não há como mudar a situação das pessoas que ajuda.
O trabalho odontológico consistia em sua maioria em curetagem dos dentes (remoção da cárie com um instrumento manual) e colocação de uma restauração provisória.
A parte de prevenção, com palestras, era pouco absorvida. A extrema dificuldade financeira das populações ribeirinhas tornava difícil a aplicação de normas simples, como a escovação após todas as refeições e o uso de uma escova por pessoa.
Naquela manhã, um casal sentou à sua frente com uma criança. Uma mãe que aparentava estar próximo aos quarenta anos, pela dureza de suas feições e pele castigada pelo sol, porém com 23 anos. Baixinhos. Os ribeirinhos são, em sua quase totalidade, de estatura baixa. Ao fazer as perguntas básicas sobre a estrutura da família, colheu os seguintes dados: um casal, seis filhos, renda familiar = 50 reais por mês.
Com cinquenta reais por mês, como imaginar que um pai gastará dinheiro com 8 escovas e creme dental para sua família? Já será difícil conseguir comida para completar a refeição dos peixes que pesca para sua sobrevivência.
O Brasil e seus constrastes. Há regiões em que é comum se gastar 50 reais em um jantar, num restaurante simples. Em outras, famílias sobrevivem por um mês inteiro com este valor.
Uma região com famílias esquecidas, soltas por sua própria sorte, à márgem da sociedade. Da mesma forma que sobrevivem às margens dos rios da Amazônia.