sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Boa ação ou...

Uma amiga internauta, Pétala, disse em um comentário, sobre o atendimento na área da saúde. Realmente, há uma necessidade enorme dos profissionais dessa área tratarem os pacientes da melhor forma possível, fazendo com que se sintam especiais.
Esse seria o básico, o primeiro passo de todo atendimento por um profissional da saúde: cumprimentar a pessoa, saber que antes de uma doença, uma cárie, um problema, temos ali em nossa frente um semelhante que precisa de atenção.
Infelizmente, nos dias atuais, muitas pessoas se esquecem disso e, quando um profissional faz o básico, aquilo que é seu primeiro dever, parece que é algo diferenciado.
Quantas vezes agradecemos muito a uma pessoa uma ajuda, elogiamos e nos impressionamos. "Que cara bacana!". Porém, se a mesma pessoa não se oferece para ajudar quando precisamos, passa direto, achamos o maior absurdo do mundo. Ajudar, tratar bem o próximo, é sempre nosso primeiro dever.
Lembrei-me disso pois ontem, enquanto saíamos de manhã para o trabalho, passei em frente a um hospital que existe na rua de casa. Uma mãe tentava, com muita dificuldade, subir a cadeira de rodas em que a filha estava por uma pequena rampa, que disfarçava um degrau.
- Precisa de ajuda? - perguntei, e a mulher prontamente me deixou subir a pesada cadeira de rodas.
Me agradeceu com um sorriso e segui adiante. Juliana, minha esposa, me disse:
- Já fez sua boa ação de hoje!
Ao que respondi:
- Minha boa ação não, minha obrigação.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Imagens do Brasil: crianças

Começarei no blog hoje a idéia dada por um grande amigo, Rafael Beolchi. Por ser apaixonado pelo nosso país, ele "devorou" as fotos que estão na lateral, que seguem o mesmo nome desta postagem.
- Por que você não fala sobre elas, as circunstâncias em que foram tiradas, histórias...
Boa idéia Beolchi! E a cada uma que retirar, para virar história, colocarei uma nova lá embaixo.
Espero que gostem!

Um grande abraço!
Wolber Campos



Se há algo que emociona, é a inocência de uma criança. Por fazermos trabalhos em escolas, o contato com elas é intenso. A amizade também.
No sertão, elas tem um carinho diferente. É um carinho mais intenso, espontâneo, carente, sôfrego.
São várias as situações em que, quando chegamos, nos avançam, umas quatro ou cinco (ou mais!), e nos abraçam, seguindo dessa forma enquanto andamos até a escola, num fundo musical de risadas e palavras de saudade.
Ainda guardam aquela saudosa infância, perdida na cidade grande, onde brincar na rua de terra, jogar futebol com golzinhos de pedra na rua, empinar pipas, nadar em rios e açudes, faz parte de uma deliciosa rotina depois das aulas.
Não admira que se tornem, futuramente, adultos de paz. Os mesmos que nos abrem as portas de suas casas com todo carinho e hospitalidade.
A velha e boa "hospitalidade sertaneja" começa desde cedo.

* Foto de Luis Salvatore

domingo, 29 de agosto de 2010

À noite

Ele acorda cedo, em torno das 5 da manhã. Desce as ruas da favela em busca do ponto de ônibus que fica lá no asfalto. Sempre apreensivo, cumprimentando com a cabeça aqueles que já foram grandes amigos das "peladas" de infância, quando corriam atrás de uma bola de meia e a vida parecia não ter tantas preocupações. Hoje sim, tem consciência das privações que sua família passa e da violência que o cerca.

"À noite, quando o calor se mistura com a luz da tv preto e branco
À noite, eu quieto dentro de casa ouvindo rajadas de bala"


Entra no ônibus e viaja, no tempo e em pensamentos. Sonha acordado com dia que sua vida vai mudar. E vai mudar, sabe disso. Só não sabe quando. Enquanto isso trabalha muito e, cansado, viaja de volta para seu barraco. Saiu no escuro, volta no escuro.

"À noite, fatos ruins do jornal se unem ao meu cansaço
À noite, o mesmo corpo cansado as vezes se perde em frente à saída"


É duro, sabe, mas entende também que a vitória tem mais gosto com o tempero do suor. Imagina os playboyzinhos que ganham tudo de mão beijada dos pais e não dão valor a isso. Já viu vários se acabando no mundo das drogas, que se esparrama pelas ruas de sua favela. O dinheiro compra a droga, mas não a paz. E isso ele tem. Graças a Deus! Pensa nos antigos amigos, que se enveredaram pelo caminho mais fácil e muito mais perigoso: o do crime.

- Mano, a sociedade é injusta! O nego rala que nem um condenado pra tirar uma merreca por mês. No tráfico eu ganho 3 vezes mais! - cansou de ouvir.

Já pensou muito no assunto, e chegou à conclusão que índole, nasce com a pessoa. Não existe essa história de "a miséria empurra para o crime". Tem muitos amigos do bem, que são tão pobres como ele e decidiram escolher o caminho correto. Isso é desculpa de quem já era "torto". A favela tá abarrotada de gente honesta.

"Mesmo assim eu paro e agradeço
Por eu não fazer do rancor minha vida
Por ainda acreditar no poder do amor
Revolucionário e salvador
Amor que me tirou a arma da mão
E me deu mais essa canção"


E assoviando uma melodia, deita a cabeça, leve, no travesseiro duro e amarrotado. E dorme em paz.



Texto e estilo inspirado no blog Mulher na Polícia
Música: À noite - O Rappa, de 1994