terça-feira, 7 de outubro de 2008

Amor de mãe

Poucas coisas estão mais enraizadas ao senso popular. O amor materno é algo instintivo, inexplicável e completamente necessário para o desenvolvimento humano e da sociedade. O que seria de nós sem este carinho universal? Como lidaríamos com uma vida sem este bálsamo diário?
Um garoto de quinze anos pode tentar responder a essas perguntas. Seu nome é Jackson. A comunidade de Canudos, na Bahia, é seu lar. Lidar com o abandono é sua sina, seu duro cotidiano.
As regras costumam ter suas exceções e não é fato raro, ou novidade, observarmos mães que maltratam seus filhos ou que cedo os abandonam. O que torna a história de Jackson diferente é quando isso aconteceu.
Sua infância, como a de muitos garotos sertanejos, não foi fácil. Foram muitos os dias em que passou fome com seus três irmãos devido às dificuldades financeiras da família. Se alimentavam apenas uma ou duas vezes por dia. Havia ocasiões em que tomavam leite de manhã e agüentavam até de noite para poder comer algo.
- Mesmo assim não era ruim não, a gente tava “tudo” junto e vivia feliz, uns cuidando dos outros. – diz, com o sorriso de quem se lembra de uma coisa boa.
O pai esteve ausente durante toda sua vida. De vez em quando o encontra pelas ruas e, respeitoso, sempre o cumprimenta pedindo “bênção”, mas a relação “pai e filho” sempre acaba por aí.
- Pra falar a verdade, se meu pai morresse eu não ficaria muito triste, de chorar, não. Eu nunca tive contato com ele mesmo. Agora se minha mãe morresse aí eu ficaria triste. Apesar de tudo que ela me fez não sinto raiva dela. Sinto falta.
Sua vida começou a mudar quando a mãe conheceu Antônio. Desde o começo percebeu que o novo namorado dela não se preocupava em ser agradável, nem com ele nem com seus irmãos. Muito pelo contrário: perdeu a conta de quantas vezes o homem foi grosso ou os maltratou. Porém, com Jackson, era ainda pior, se tornava até agressivo.
Mas o que fazer, se era a escolha dela...
Tudo começou a piorar quando ela decidiu morar com Antônio. No princípio os quatro filhos foram juntos. Porém em uma casa estranha e com um padrasto agressivo - que demonstrava não estar nem um pouco feliz com a presença dos filhos de sua amaziada - logo perceberam que a vida não lhes reservava flores nos próximos dias.
O padrasto arrumava qualquer motivo para poder brigar com o rapaz e quando não havia, inventava alguns:
- Ele começou a dizer que eu fumava maconha. “Magina”, nunca fui dessas coisas. Mas ele espalhava isso pra todo mundo.
Com o tempo a agressividade foi aumentando. Várias vezes, ao chegar tarde da escola, o portão da casa estava trancado. Jackson tocava a campainha mas ninguém lhe abria a porta. Sabia que todos estavam lá dentro, mas não davam sinal algum. Só não dormia ali, na calçada, em frente ao portão, porque a vizinha se compadecia e o convidava pra passar a noite em sua casa.
Sua tristeza aumentava cada dia mais ao perceber que a mãe não ficava do seu lado. Acompanhanva passiva o sofrimento do filho.
Tudo seguiu na mesma triste rotina até o dia em que em outra discussão infundada o padrasto o expulsou de casa. De tudo o que sentia naquele momento, o que mais doía era olhar sua mãe e perceber que ela não tomava partido. Consentindo, ela ali, quieta, também o expulsava de casa. Jackson, aos 11 anos, era abandonado por sua mãe.
Sem rumo, ou algo a fazer, voltou para Canudos Velho, onde conhecidos poderiam ajudá-lo.
Raimundo, um pedreiro de aparência séria, mas de coração mole, resolveu abrigá-lo em sua casa, junto aos seus outros dois filhos. E lá o rapaz ficou por alguns meses.
Eduardo, um homem bondoso, dono de um bar num bairro mais afastado dali, se emocionou com sua história e o convidou para morar com ele. Jackson, nas primeiras vezes agradeceu e recusou. Maior era o medo de ser rejeitado pela terceira vez, depois do pai e da mãe. Como um pequeno gato, que fica arisco e mais distante depois de ser muito maltratado, ele se manteve um pouco afastado de tudo.
Mas o tempo, que tudo cura, foi passando e a alegria habitual foi voltando ao seu grande e maltratado coração. Aceitou o convite de Eduardo e foi morar em uma nova casa, desejando agora começar vida nova, deixando para trás todas aquelas dificuldades e tristezas ultrapassadas.
- Não vou me revoltar com tudo isso. Sei que não vai me ajudar em nada, muito pelo contrário.
Hoje Jackson sonha. Com uma vida nova, com o carinho de uma família, com um futuro mais amigável. Sonha também com um video-game, com óculos escuros bonitos como os de um amigo seu de São Paulo, com uma bicicleta. Sonhos que, grandes ou pequenos, vibram em seu peito com o mesmo valor.
Nota-se isso em seu sorriso aberto sobre sua nova bicicleta. Ele e o amigo Quinha ganharam uma cada um do Instituto Brasil Solidário pela ajuda que sempre prestam quando o IBS está na região.
Vento em sua face, a música do pneu empurrando o asfalto sob si, os olhos no horizonte. Segue firme pela estrada de Canudos Velho, pedalando adiante, como quem segue buscando o seu futuro. Na esperança de que ele seja tão bonito quanto aquele belo pôr-do-sol que se esparrama à sua frente.

O pé na estrada

Olá amigos!
Nesta semana, quarta-feira (dia 8 de outubro), parto em viagem novamente pelo sertão com o IBS. Chegaremos em Goiânia, onde trabalharemos na quinta e sexta e de lá seguimos para Uruaçu (GO), Paranã, Ponte Alta, Palmas (TO), Balsas, Nova Iorque (MA), São Raimundo (PI), Crateus (CE), Mossoró e Natal (RN).
Ficaremos um mês na estrada, por isso o blog poderá ficar um tempo sem atualização, para a tristeza de seus mais de dois leitores assíduos (tudo bem, eu admito: eu sou um desses dois...) rs
Porém tentarei postar algumas fotos e a história do Del pelo caminho.
Delino é um garoto de Nova Iorque, no Maranhão. Conheci a história difícil dele e aqui em São Paulo, quando voltei, organizamos uma vaquinha para comprar um violão, um afinador, jogo de cordas e bag para dar a ele de presente. Como é um garoto super inteligente (e é mesmo!) deve aprender fácil. Quem sabe futuramente não temos um ótimo violeiro por aquelas bandas?! Imagino que ele ficará maluco com o presente, vamos ver...
Posto em seguida uma última história antes da viagem, a de Jackson, nosso amigo de Canudos.
Amigos, ótimos dias a vocês!! Até a volta!

Grande abraço!
Wolber Campos