sábado, 12 de fevereiro de 2011

Mais uma

Olá amigos! Nada como a tecnologia. Escrevo este texto dentro da van do Instituto Brasil Solidário, enquanto viajamos para mais um trabalho. 
Faremos o projeto "Sorriso Solidário" no Vale do Jequitinhonha - próximo da divisa entre Minas e Bahia -, onde trabalharemos em 5 municípios nas próximas duas semanas. 
Tentarei fazer uma espécie de diário durante esses dias, postando histórias, novidades ou mesmo contando sobre nosso dia. 
Peço desculpas antecipadamente por eventuais erros de digitação ou pressa na hora de escrever. Na verdade, espero até que eu encontre sinal de internet por aquelas bandas. 
Seguimos em dois veículos, puxando duas carretinhas cheias ao máximo de sua capacidade, com todos os equipamentos, incluindo 3 cadeiras de dentista portáteis. Um Deles é uma caminhonete e o outro é uma van, onde vão 8 pessoas, onde escrevo tendo ao meu lado esquerdo o Vítor Pinduca (cinegrafista e editor), dormindo assustadoramente de boca aberta, e ao meu lado direito a Ana Elisa (coordenadora do IBS), arrumando o lay out da minha palestra. 
É sempre uma felicidade retomar para um trabalho. A saudade das pessoas queridas aperta, mas é abrandada pelo bem que o projeto nos faz e pelos grandes amigos de estrada. 
E é desta estrada que me despeço de vocês. Em breve trarei notícias. 
Um grande abraço a todos!

Wolber Campos

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Doutora brasileira: pontos de vista

Eles estavam na lancha, se encaminhando para uma comunidade ribeirinha, localizada no alto do rio Solimões. O céu, como de costume, estava fechado. Na Amazônia, havia dias em que de manhã estava um sol forte e intenso, algumas horas depois se nublava, prestes a uma grande chuva.
O calor, também como o costume, era intenso demais. Com o ar completamente úmido, o macacão da Marinha dava a impressão de cozinhar seu corpo, onde o suor escorria constantemente, mesmo com o forte vento que batia em sua face.
A lancha viajava muito mais rápido que o navio, assim poderiam atender algumas horas até que este os alcançasse, para seguirem viagem.
Chegaram em seu local de trabalho, atracaram a embarcação na terra e subiram o imenso barranco. Era uma época mais seca e o leito do rio ficava muito mais abaixo do que a margem e subir aquelas terras barrentas era uma grande dificuldade.
A comunidade ribeirinha, geralmente, se formava em uma pequena clareira na floresta. Vinte a trinta casas, quando muito, se espalhavam, rentes à "cortina" de gigantes árvores que as envolviam.
- Incrível como a floresta se impõe sobre nós - comentou com uma colega. A sensação era, realmente, como se as enormes árvores sufocassem tudo a sua volta.
As casas de palafita estavam como de costume, com as criações de porcos, bodes e galinhas debaixo de seus assoalhos, o que trazia um cheiro característico e forte a todas elas.
Enquanto se encaminhavam para a escola, onde fariam os atendimentos, muitas crianças correram ao seu redor. Essa cena era comum a cada chegada, mas daquela vez, a empolgação era maior.
- Doutora! Doutora! Vem ver a onça!! Vem cá!! - diziam, a puxando pela mão.
Seguiu atrás delas, pressentindo algo. Quando chegou em uma pequena roda de pessoas, bem próximo à enorme cortina natural da floresta, sentiu um arrepio por todo o seu corpo. Ali, estirada na grama, estava ela: uma linda onça pintada. Enorme, como havia visto apenas pelas fotos dos livros, amarela e rajada de manchas negras. Morta.
As crianças sorriam, os adultos orgulhosos. E a doutora não conseguiu esconder sua cara de espanto e tristeza.
Em sua frente, jazia um maravilhoso animal em extinção. Percebendo a feição de decepção da médica, um homem, de seus 40 anos lhe falou:
- Doutora, isso aqui não é brincadeira não. Já fazia um tempo que a gente estava atrás dessa bicha. Umas semanas atrás, ela matou uma das nossas crianças. E esse bicho é assim, viu que aqui tinha comida pra ela e ia voltar, até pegar outra.
Começou a se dar conta. Tinha aprendido desde os livros de escola, da importância de se preservar aquele lindo animal, em extinção. Mas ali, na floresta, o ser humano era mais um animal, lutando pela sua sobrevivência. Era a onça, ou o filho.
Fácil tomar decisões e ter suas verdades atrás de uma mesa, na capital. Ter seu filho brincando ao lado de uma onça faminta, é outra coisa. É outro ponto de vista.