sábado, 29 de maio de 2010

A outra educação

Sempre que posso repito em textos o que acredito: que o segredo de toda melhora e desenvolvimento do Brasil está na educação. Posso dizer que em ambas, se é que realmente existe mais do que uma.
Digo isso porque ontem à noite vi um exemplo recorrente da outra educação, não aquela que depende de escolas, professores capacitados, incentivo do estado. Não, um problema que cabe mais à educação dada em casa e até mesmo à índole da pessoa.
Mas retorno à noite de ontem - antes que comece a "viajar" e esqueça o simples fato ocorrido - onde andava pela calçada, próximo de casa, perto das 9 horas da noite. Um cidadão em seu carro, parado no farol, deu uma última mordida num lanche e jogou todo o resto pela janela, na rua. Fui "bonzinho" agora, dizendo que era um resto. Na verdade se tratava de um grande pedaço de pão com "sei lá o quê", uma salsicha talvez. Pouco importa, logo se tornava um amontoado de comida no chão.
Ainda agora me pergunto: O que faz uma pessoa, simplesmente, jogar um lixo assim no chão, em frente a todos? E não é uma falta de educação que escolhe classe social. Vejo com frequência carros novos - e caros! - abrindo seus vidros e atirando para fora latas de refrigerante, papéis de bala e uma infinidade de objetos.
Em Minas Gerais conheci o dono de uma pousada, uma figura, andou por vários países de mochila mesmo. Conta a história de quando passeava pelas ruas de Toronto, no Canadá. Comprou um chocolate e andava observando as fachadas da cidade e, sem perceber, jogou o papel no chão.
- Moço, um cara fortão veio por trás e me deu um tapa no pescoço. Tão forte que eu sinto até hoje! - disse passando a mão na nuca.
E já fazia muitos anos. O homem apontou o papel no chão e disse algo que ele não entendeu, mas o significado saberia qual era, mesmo se fosse dito em coreano. Algo como "pega e jogo no lixo seu porco!!!".
- Depois desse dia eu nunca mais joguei um papelzinho de bala, que seja, na rua. Guardo no bolso e jogo no lixo de casa.
Lembrando da cena de ontem, acho que um cara mais esquentado - e muito mais forte... - poderia fazer a diferença na vida de um motorista "porco".

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Uma "vezinha" só

Era uma segunda comum, em uma cidade do interior do Maranhão. Havíamos feito amigos ali, que se juntaram à nossa rodinha de violão. Música vai, música vem, papo vai, papo vem e a fome também veio. Olhamos em volta - estávamos numa praça - e não havia um barzinho aberto.
- Tem só o posto lá em cima, mas é uma boa andada até lá. - nos disse um amigo local.
Como a fome era grande - e não estávamos com pressa - fomos para o único posto aberto na cidade. Se não fosse o único que havia ali. Seguimos andando e conversando e os dois quilômetros passaram rápido.
Chegando no local, uma cena nos chamou a atenção (pelo menos para nós, que éramos de fora): um segurança com uma grande arma (imagino que era uma 12, entendo pouco de armas) nas mãos, andando de um lado para o outro, olhar atento. Nos fitou e deve ter imaginado que não tínhamos cara de marginais. Pelo menos eu esperava por isso...
Entrei com os amigos e o Luis ficou conversando com nosso "Rambo sertanejo". Ele disse que o posto já havia sido assaltado inúmeras vezes, então o dono o contratou para "vigiar e mandar bala no vagabundo que se engraçasse por ali de novo".
Enquanto contava a história, o vigia, mostrava a arma e fazia pose de macho.
- Mas e aí, já deu alguns tirinhos com a arma? - perguntou curioso o Luis.
Ele balançou a cabeça e respondeu humildemente:
- Já. Mas acertar mesmo foi só uma vezinha...

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Crônicas de um brasileiro, ex-soldado americano: O salto noturno (por Euller Fernandes / Wolber Campos)

Euller havia entrado "de cabeça" no exército americano. Realmente, o treino era forçado ao extremo, tanto fisicamente como psicologicamente. Várias vezes ouvia seus superiores falarem que "nenhum treinamento conseguiria reproduzir o terror de balas zunindo próximas ao seu ouvido, ou companheiros caindo feridos ao seu lado num campo de batalha".
Seu próximo exercício levaria isso ao extremo. "Se não chega próximo ao campo de batalha deve chegar bem perto", pensou.
Já havia saltado algumas vezes de paraquedas e, apesar de morrer de medo a cada novo salto, já sabia o que esperar. Mas o próximo pulo seria um desafio perigoso. Estavam sobrevoando o canal do Panamá, de madrugada, e o salto noturno deveria ocorrer em um mar infestado de tubarões. O risco seria menor se acertassem o alvo: um círculo formado por alguns navios norte-americanos, onde soldados estavam com suas armas apontadas para as águas, iluminada por holofotes, atirando ao primeiro sinal de tubarões. Se caíssem fora do círculo, londe da iluminação... Que Deus os protegessem.
"Espero que os pulos anteriores tenham servido para alguma coisa", pensou. Afinal de contas, pular de centenas de metros sobre o oceano escuro, com vento e guiar um paraquedas até um pequeno círculo num mar com tubarões não era das missões mais simples.
Como das outras vezes, "Blam!!", a porta se abriu e o conhecido barulho ensurdecedor voltou aos seus ouvidos, porém desta vez, não enxergava mais nada porta à fora. Apenas um breu total!
Os primeiros foram saltando. Estava tão preocupado que esqueceu de olhar para o rosto dos companheiros e ver se estavam apavorados também. Mas é claro que estavam. Tinha certeza que dessa vez sua cueca camuflada não escaparia ilesa...
"Be prepared! Gooooooo!!", só conseguiu escutar quando estava bem ao lado do capitão. Antes de saltar ainda teve tempo de olhar o mar escuro embaixo, tão escuro que se confundia com o céu da noite negra à sua frente. Ali, muito embaixo, observava um anel minúsculo luminoso, formado pelos navios de guerra dos Estados Unidos. Se conseguisse fixar a atenção nisso, até o acharia bonito. "É lá que tenho que acertar" e saltou.
O silêncio conhecido ressurgiu, mas a preocupação em acertar o tal círculo lá embaixo não deixou que a conhecida paz o acompanhasse.
Foi caindo, vagarosamente, guiando seu paraquedas sobre os navios, que ficavam cada vez mais próximos. Ia acompanhando seus companheiros que desciam sob e sobre ele.
O coração batia cada vez mais forte, estava se aproximando dos barcos e, maravilha!, bem no centro do círculo.
Caiu de uma vez dentro d´água, afundou um pouco e se livrou das amarras do paraquedas - havia um grande risco de se emaranhar nas cordas e se afogar. Mas ali o medo dos tubarões era maior e rapidamente subiu em um barco.
Tremia de emoção ao sair da água. Sentia euforia e até vontade de chorar por ter conseguido e olhando os companheiros, sentia essa mesma emoção em cada um deles.
Não errou o alvo e não havia sido comido por tubarões. Saía do teste mais forte, sentiu vontade de ter um bandeirinha do Brasil e correr em volta do navio. Pensou "não, vai que eles me empurrassem no mar de novo...".