terça-feira, 11 de agosto de 2009

A noite especial

Toda noite era sempre igual. Ao chegar do trabalho, na calçada em frente ao meu prédio, estava aquele senhor, dormindo no chão, enrolado em um velho cobertor. Como infelizmente acontece conosco, mesmo situações que nos tocam, tornam-se menos agressivas na repetição do cotidiano. Fato que era quebrado esporadicamente, nas noites mais frias onde a compaixão voltava a aflorar com violência.
Todo dia era quase sempre igual. Eu sabia se estava atrasado ou não apenas de olhar para aquele senhor. Se desço para o trabalho às 7:10h ele está sentado, como quem espera aquela democrática preguiça ir embora para despertar completamente e se levantar. Quando saio pouco mais cedo ele ainda está enrolado na coberta, dos pés à cabeça, como estava de noite e se saio atrasado - mesmo 5 minutos - ele não está lá. Parece um relógio!
Essa convivência até nos aproxima, o senhor passa a ser, praticamente, o meu vizinho. Eu o vejo mais do que muitos vizinhos que moram dentro do prédio (não tanto como a mulher de baixo...) e com isso virou natural cumprimentá-lo. Desço de manhã com minha namorada e solto o meu "bom-dia", que é correspondido com um aceno de mão e um abaixar de cabeça.
Uma noite eu cheguei mais cedo e ele estava arrumando um papelão - seu colchão - no mesmo lugar de sempre. Passei e o cumprimentei. Ele dessa vez ergueu a mão e me dirigiu, pela primeira vez, a palavra:
- "Ei fio. Viu, eu gosto muito. Você todo dia passa com sua mulher e me fala "bom dia". Olha, eu gosto muito viu!"
E me disse de como se sente bem ali; ninguém reclama dele, o deixam em paz. E novamente me agradeceu muito o gesto de lembrar dele todo o dia.
Fiquei muito feliz em vê-lo contente por causa de algo tão simplório, apesar de saber que para ele não era nada simples receber um alô de qualquer pessoa. Não sabia que ele recebia tão bem meu cumprimento.
Toda noite era igual. Aquela foi diferente. Pelo menos para mim foi especial.

6 comentários:

  1. Oi Wolber, gostei muito desse texo que você potou. Dá pra sentir de você o quanto ele é verdadeiro, especial. Um dia nunca é igual ao outro algums são mais felizes outro tristes, fazer o que né? Se a vida tem mesmo dessas coisas.
    As vezes pra uma pessoa que não teve muita oportunidade na vida, ela é composta por momentos mais ruins do que bons, e muitas vezes o que conforta agente não é o fato de alguém passar e dá 0,25$ e sim de lhe respeitar e falar com você como se estivesse falando de igual pra igual. Dá pra imaginar como este senhor se sentiu mais humano, por causa de um simples... "Bom dia"!

    Grande Beijo!

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  2. Oi Joyce!!

    É isso, a coisa mais importante que podemos dar é o respeito. Que adianta dar 10, 50, ou 100 reais, se é de mal grado, considerando aquela pessoa que recebe inferior?

    Um bom dia sincero faz a vida da pessoa melhor do que uma esmola. E é tão mais fácil de dar.

    Você está cada dia mais voltada para esse lado social. Parabéns, fico muito feliz. :)

    Um beijão!

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  3. Oi Wolber.

    Eu penso assim, hoje em dia apesar do capitalismo está aí praticamente nos obrigando a ter mais e mais nos somos seres humanos e por mais que precisamos de dinheiro pra sobreviver, ele não é o essêncial o respeito e o carinho é o básico pra que agente se sinta alguém.

    As suas histórias, são as minhas inspirações. O seu trabalho mim encanta. Um mundo melhor sem diferença social é o que eu sonho, e acredito que vou conseguir realiza-lo, junto com pessoas iguais a você!

    Beijos!

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  4. Joyce, fiquei emocionado com o comentário. Muito obrigado, minha amiga querida!

    Sabe que eu penso que o problema não é o capitalismo, e sim o homem. Podemos ter qualquer sistema, o próprio comunismo não fez nada a mais a não ser igualar a grande maioria na miséria, como é o caso de Cuba.

    O ponto é a reforma interna da humanidade, para aí sim, reformar internamente a sociedade. É minha opinião. ;)

    Que bom que você se inspire nos textos, fico completamente lisonjeado. Você é uma pessoa maravilhosa e pura e sei que conseguirá esses objetivos.

    Estaremos todos lado a lado!!

    Beijão!

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  5. Oi! Mais um texto comovente... algum não é, neste blog?!

    Tão fácil e tão cômodo fingir que pessoas como esse senhor são invisíveis... Mas tão gratificante dar-lhes a certeza de que são pessoas, seres humanos, dignos do nosso olhar e do nosso respeito onde quer que estejam!

    Seu 'bom dia' fez grande diferença, assim como os biscoitos que minha amiga Gabriela compartilhava com um senhor nas mesmas condições, toda vez que ela saía de seu apartamento em direção à faculdade (conto a história em uma de minhas crônicas)... fez a diferença para vocês, que se tornaram essas pessoas 'do bem', valorosas e cheias de amor ao próximo - capazes de iluminar o mundo!

    Abraço.

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  6. Olá Suzy! Tudo bem?

    Como tornar vísíveis esses inúmeros homens, mulheres e crianças invisíveis que estão em nosso dia-a-dia?

    Situações, das mais chocantes, vão se tornando rotineiras pelas repetições do nosso cotidiano.

    Não é chocante um ser humano, um irmão, dormir em um chão duro, ao relento, mesmo em noites frias? É um absurdo! Mas em cidades como São Paulo é mais frequênte do que vermos alguém ajudando uma velhinha na rua.

    Amor ao próximo, caridade, é um exercício diário.

    Bem vinda a mais um texto Suzy! :)

    Abraço!

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