domingo, 21 de março de 2010

Auto-julgamento

Hoje fiquei um pouco furioso comigo. Enquanto escrevo estas palavras fico em uma briga e decepção comigo mesmo.
Hoje cheguei de um delicioso churrasco na casa de um casal amigo. Levei o violão como companheiro e como pedido dos amigos.
Para expressar o quanto fico bravo comigo mesmo, volto alguns meses atrás.
Há vários meses, voltando de algum passeio do dia-a-dia, trouxe meu violão nas mãos. Ao deixar o carro no estacionamento, o porteiro do local me disse empolgado: “Oh, doutor! O senhor toca um violãozinho também?!”. Disse-me e comentou que gostava de rock and rol, e citou algumas bandas de que eu gostava muito, completando: “qualquer dia desses eu queria muito que você tocasse um pouco comigo aqui, para deixar a noite mais alegre!”.
Assim, a partir daquele dia, ele me cumprimenta como “doutor cantor”, mesmo sem saber do quão pouco eu toco, ou canto, mas pelo simples fato de eu retirar o carro vestido de branco e algum dia tê-lo guardado com um violão nas mãos.
Não foram poucos os dias em que eu, voltando de alguma saída com os amigos, cheguei ao estacionamento com o violão na mão e cansado, com vontade de chegar logo em casa. Meu amigo do estacionamento, humilde como sempre, me falava a cada vez: “Oh, doutor cantor! Qualquer dia toque um pouquinho aqui. Só duas musiquinhas, pra noite ficar mais alegre!”. Sempre com um enorme sorriso no rosto e sem exigir eu tocasse naquele momento.
Faz umas duas semanas, senti falta desse amigo. Não estava mais no estacionamento. “Deve ter saído, ou ter sido mandado embora”, pensei. Uma pena, pois hoje em dia, é cada vez mais difícil de se encontrar um funcionário que, além de cumprir sua função, está sempre de bem com a vida e com um puro sorriso em seu rosto. Assim era o Dias, sempre feliz e bem disposto. Um exemplo!
Hoje, depois de um longo tempo, eu o revi. Novamente ele abriu o portão do estacionamento.
- Oh meu amigo! Você voltou! – eu disse, sinceramente feliz em revê-lo.
Ele, humilde como sempre, sorriu e abriu a porta para que eu entrasse. Tranquei o carro e peguei o violão que havia levado ao churrasco e fui ao seu encontro, curioso em saber o motivo de seu afastamento.
- Meu amigo, nem te falo! Eu quase morri! Fiquei internado esses dias. Deu um problema lá em casa, o proprietário queria a casa e arranjou uma confusão. Eu fui conversar com ele e ele pensou que eu fosse brigar, alguma coisa assim, e me recebeu me “metralhando”. Me deu seis tiros! Dois me acertaram, um me varou aqui – disse e me mostrou um machucado pequeno, por onde tinha penetrado uma das balas e ultrapassado pelas costas – e o outro entrou aqui na barriga. Essa bala ainda está alojada, o médico achou perigoso retirar.
Dias é um homem sincero, alegre, sempre de bem com a vida. Tenho certeza absoluta de que ele nunca arranjaria confusão com o homem que disparou os tiros, tentando matá-lo. Mesmo assim, quase morreu.
Por isso hoje, escrevo tão bravo comigo mesmo. Fiquei muito feliz em revê-lo. Mais feliz ainda, por saber que estava vivo, depois de saber da história. Mesmo assim estava com o violão nas mãos e não toquei nenhuma música para ele. Disse a mesma ladainha de sempre: “Dias, assim que der,a gente faz um sonzinho aqui”. Ele, feliz como sempre, me disse que ficaria muito feliz com isso.
Por muito pouco eu poderia não ter essa oportunidade. E fui embora como das outras vezes, dizendo a mesma coisa que das outras vezes. Hoje eu perdi uma grande oportunidade.

6 comentários:

  1. Wolbão, nessas horas que as oportunidades passam não adianta carregar a culpa... aproveita esta outra "oportunidade" para aprender com a situação (que pelo visto você já fez) e para trabalhar o perdão (a si mesmo). Abração! rs...quanto "ão" ... rs.
    PS: cada história que te aparece, hein!?
    PS2: tá muito legal este blog. Sendo seu só podia ser muito humano! Parabéns!

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  2. Doc. leva a coisa pra esse lado não... todo dia somos também "metralhados" por estímulos e informações desencontradas de uma sociedade, no geral, muito doente que quando oportunidades aparecem para que saiamos de tal correria convidados por um momento de sossego e de partilha muitas vezes não nos damos conta.
    Talvez o primeiro passo à mudança seja justamente nos darmos conta de que estamos mergulhados em um mar de desassosego para poder, graças a bondade da matéria que nos constitui, voltar a essência e ver da superfície a clareza dos fatos!
    um grande abraço,
    João Victor.
    ps.: teu blogg ta realmente muito bom...

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  3. Graaaande Filps!
    Cara, valeu pelas palavras. Você tem toda razão!
    Que prazer ter você como leitor do blog. Maior honra!! :)
    Grande abraço!

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  4. Grande Johnny!!! Valeu, meu irmãozinho. Entendi o que você quis dizer e concordo. As vezes é difícil sairmos dessa inércia do dia-a-dia, principalmente nas grandes cidades.
    Um abração!

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  5. Oi meu amor, sabemos pq vc perdeu essa oportunidade! Mas tenho certeza que na proxima estarei junto com vc, te apoiando! bjs

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  6. Oportunidades ao lado do seu amor - seja ela ou o violão - não devem ser perdidas...

    Wolber a idade nos ensina a aprender a lidar com as nossas limitações de tempo para atender tantas demandas... são as escolhas...
    ABs
    FAB

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