terça-feira, 29 de junho de 2010

Crônicas de um brasileiro, ex-soldado americano: O índio (por Euler Fernandes / Wolber Campos)

Era noite de domingo e dia seguinte, mais precisamente às 4 da manhã, estaria de pé para mais um dia de trabalho duro no exército. Deitado em sua cama, como de costume, Euler mudava os canais à procura de algum programa interessante. Num deles, viu um documentário sobre os índios americanos. Caçadores afirmavam que viam espíritos dessa antiga população na floresta. Pensou em mudar o canal, não gostava dessa história de espíritos, mas o assunto era interessante.
Tinha uma explicação científica por ter medo de espíritos:
- Algo vivo, a gente tem como matar para se defender, agora algo morto não tem! O que vou fazer se vier um espírito? Matar de novo? - conclui.
Mas agora era um soldado do exército mais poderoso do mundo, tinha que, pelo menos, enfrentar seus temores. Assistiu até o fim.
O documentário mostrava a entrevista de caçadores e uma dramatização. Descreviam que ao se esconderem nas árvores, ouviam aquele conhecido grito indígena: "Uuuulululululululululuulu!!!". Tremendo de medo, viam depois um índio, vestido com suas roupas e penas na cabeça, tão nítidos como nós, porém, brilhantes, como se emanacem luz.
Morreu de medo, mas só desligou a TV quando o programa terminou. Naquela noite, dormiu de luz acesa.
Dia seguinte, viajaram para a floresta, na Carolina do Norte. Já havia dormido naquelas matas e, para falar a verdade, dormia até quando montava guarda. No começo da noite um amigo começou a vigília, ele seria o próximo. Até lá, como todos faziam, armou sua improvisada barraca - estendendo a pesada capa de chuva sobre 4 estacas no chão - e dormindo abraçado ao seu fuzil. Nem a chuva, que caía incessantemente, atrapalharia seu sono.
Mais tarde acordou sendo chacoalhado, demorou para despertar, mas se sentou num susto. Era seu colega, dizendo que sua hora de ficar de guarda havia chegado. A adrenalina do susto baixou e, sonolento, se levantou. "Que preguiça!". Levantou do jeito que estava, já entrando sob a capa de chuva e seguiu andando para o posto - um buraco mais além na floresta.
"Tlililililililililim", ouviu um barulho atrás de si. Parou na hora, assustado. A primeira coisa que veio à sua cabeça foi a imagem do índio, ainda viva em sua memória como se tivesse acabado de desligar a TV naquele momento. Não era um "Uuuulululululululululuulu!!!", era mais fino e um "Tlililililililililim", mas vai saber se era um índio meio esquisito... Torceu para ser sua imaginação e voltou a andar.
"Tlililililim", dessa vez parou na hora e se voltou para trás apontando o fuzil em todas as direções. Sentiu vontade de disparar balas para todo o lado, no estilo Rambo, xingando de todos os nomes aquele índio maldito, mas se controlou. Tentou se acalmar, se virou, respirou fundo e foi andando.
"Tlililililililililim", continuou o barulho o seguindo. Ele andava mais rápido e, incrível, o som vinha atrás, na mesma velocidade. Começou a correr e era como se o índio corresse logo atrás, quase em seu pescoço.
"Ahaahhhhhhhhhhh!!" gritou internamente, para que seus companheiros não se assustassem também e pluft! se atirou de uma vez no buraco que iria montar a guarda. O som cessou assim que entrou na vala. respirava ofegante, segurando seu fuzil e olhando para todos os lados, temendo ver a luz do índio americano.
Geralmente dormia quando montava guarda, encostado na parede. Aquela noite ficou acordado, olhos arregalados, atento a cada estalar de galho, ou pequeno barulho, algo comum numa floresta.
Veio o amanhecer e a luz do sol é acompanhada dessa mágica, espanta todos os medos e faz nossos calafrios noturnos parecerem bobos. Se espreguiçou e pulou fora de seu buraco. Estava "quebrado" por não ter descansado. Deu um passo em direção ao acampamento e "Tlililililim", agora olhou para trás e deu mais um passo. "Tlililililim", batiam as quatro estacas de metal de sua capa de chuva, as mesmas que esqueceu de guardar no bolso ao se levantar "bêbado de sono" para montar a guarda.
Lembrou da noite mal dormida, guardou as estacas no bolso e teve vontade de chorar de raiva do índio americano.

5 comentários:

  1. haha.....rs
    Isso me lembra uma história quando eu era garota e nossa turma disse que entraria no cemitério da consolação à noite...rsrsrsrsrs
    foi mais ensaio e planos e estratégias do que qualquer outra coisa.
    O imaginário toma conta e é capaz de dominar.

    Um beijo e...olha o índioooooooo.....rs

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  2. É realmente só acredito porque conheço esse soldado maluco, não vejo agora de nos encontrarmos novamente pra vir a tona mais uma "História de um soldado americano"... Boa muito boa. Grazi

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  3. Mano e encrivel como voce conta melhor que eu......

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  4. Grande Euler! Que bom você por aqui!
    Já tinha gente achando que você era ficção, meu chapa. rs
    E a escrita não é melhor que você contando não. A cara de medo e gestos dão um toque a mais ao vivo.
    Valeu pelas histórias!

    Abração!

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  5. Adorei!!

    Quando já estamos com medo, qualquer vento faz uma folha virar fantasma.

    Um grande abraço, amigo.

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