Recebi em casa ontem a noite, um grupo de amigos para uma reuniãozinha despretensiosa de final de semana. Dentre eles, havia um casal que eu conhecia muito pouco; que acabou vindo à minha casa atendendo a um convite indireto de um amigo.
Enfim, em conversa com esse meu novo amigo, fiquei sabendo como o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) tinha sido largado pelas autoridades tucanas (PSDB) - ele havia trabalhado lá como engenheiro havia 10 anos. Segundo ele, foi promovido uma redução paulatina e gradual no orçamento da Instituição em questão - teria iniciado com o governador Mário Covas e levadas a cabo pelos governadores Geraldo Alckmin e José Serra. Ainda, segundo meu recente amigo, o que ultimamente teria dado um fôlego nesses últimos dois anos ao IPT, seria um projeto da Petrobrás fomentado pelo presidente Lula, que empossou o IPT na condução deste.
Coloquei no parágrafo acima, tudo o que sei a respeito do IPT. Não sei quão a reclamação desse meu novo amigo é procedente, quão o IPT é eficiente, o que motivou a redução do seu orçamento, até que ponto nosso presidente Lula foi feliz e autruísta com essa medida, mas enfim, essa história toda me remete a um outro ponto: massificação e qualidade.
Massificar significa perder qualidade! Ponto. É fato, infelizmente ou felizmente.
A geladeira da vovó durava uma vida inteira, em compensação, muito poucos possuíam uma igual. A minha geladeira que tem por volta de cinco anos, vem com instruções sobre a forma como devo jogá-la fora (desconectando-se a porta para que alguma criança brincando na rua não se tranque dentro dela enquanto a mesma fica aguardando o lixeiro na calçada).
O colégio estadual Fernão Dias Pais (por acaso o mantenedor desse blog é ex-aluno de lá) era referência de ensino de qualidade na geração dos meus pais; em compensação a população rural brasileira naquela época era incomparavelmente maior - quantos analfabetos por aluno que se formava custavam aquele ensino de qualidade?
Portanto temos aqui uma grande questão: quanto deve-se perder em qualidade em nome do aumento do acesso a uma determinada facilidade? Embora hoje em dia a geladeira dure muito menos se comparado às antigas, provavelmente encontraremos esses aparelhos em favelas. Se hoje o ensino provido por uma por uma escola pública fique muito aquém do que é exigido em um vestibular de uma faculdade de primeira linha, provavelmente o índice de analfabetismo seja menor que o do período do "colégio público de qualidade".
Agora, independentemente do culpado, o Brasil tem um problema grave: a dificuldade em se massificar o acesso às facilidades! Massificou-se o sistema de saúde por meio do SUS, e ele entrou em colapso! O poder econômico do brasileiro aumentou em uma década para cá: ficou ao alcance de mais pessoas viajar de avião e comprar um carro: caos aéreo e índices recordes de trânsito.
Voltando à saúde: não cumpre aqui debater se há poucos recursos ou se são suficientes, mas é óbvio que existe um problema grave de gestão. Hoje em dia, quem não possui meios para pagar um plano de saúde, fica refém do SUS. Logo de início, esse cidadão já tem um problema tão simples quanto dramático: tempo de espera para realizar consultas e exames. Quando esse cidadão (esse que só pode recorrer ao SUS) cai doente, ou quando precisa de uma consulta, bate na porta dos postos de saúde. Vai lá para marcar uma consulta médica, obter um diagnóstico que pode ou não exigir um ou mais exames. O mais comum é que, no posto de saúde, comuniquem a ele que deve voltar em 30 ou 40 dias para aí então marcar a tal data da consulta! Quando conseguir, talvez terá que esperar mais outros 30 dias. Trata-se de uma situação abominável. Se vocês, assim como eu que até uns dias atrás não tinha noção que era assim que a coisa funcionava, vão perguntar de imediato: mas e aí? Afinal o pobre coitado precisa de atendimento médico!
Aí acontecem várias coisas: o paciente se automedica, fica sem assistência e se cura, fica sem assistência e a doença piora, vai para um município vizinho onde o atendimento é um pouco melhor e, o mais comum, vai para um hospital. O hospital não foi feito para atender a consultas e exames. Hospital é lugar de emergência, cirurgia e internação. Os exames ali feitos são com essas finalidades. Ainda assim, o hospital não pode negar atendimento. Resultado: uma consulta que iria durar uns 20 minutos em um posto de saúde, dura 5 minutos em um hospital. O paciente sai, pelo menos, com uma receita e a crença de que foi atendido. O hospital deixa de cumprir sua função básica.
A crise aérea: uma pena que a resolução da crise aérea tenha sido por meio do aumento de passagens. Absolutamente lamentável. Já que não é possível atender mais gente, já que não temos capacidade gerencial, técnica, operacional de fazer com que o sistema funcione incorporando mais consumidores, a solução é muito simples: reduza-se o número de passageiros! Levando-se em conta que em um passado recente houve dois graves acidentes aéreos e comparando-se nosso tráfego de aeronaves aos tráfegos europeus e norte-americanos, pelo menos a mim fica explícita a dantesca incompetência gerencial desse governo para o setor de transportes aéreos! Sei que o jato da Gol pode ter sido abatido pelo Legacy por uma série de causas técnicas como o Tcas desligado e etc. Assim como sei que o jato da TAM pode ter caído porque estava chovendo, a pista não tinha grooving, etc etc etc... mas fato é: no primeiro caso houve um problema sim de infra-estrutura de controle do tráfego aéreo. Já no segundo, é sabido desde a época que fiz engenharia a quase 10 anos atrás, que o aeroporto de Congonhas em São Paulo deixou há muito tempo de operar dentro dos limites de segurança devido a alta demanda.
Índices recordes de trânsito: acho que dos três exemplos, esse é o mais visível, o mais presente em nossos cotidianos. A solução? Transporte público. E a grande culpa do governo aqui é na falta de investimentos sérios nesses transportes coletivos e em segurança. Isso fica evidente quando você tem a oportunidade de, em um país desenvolvido, pegar um metro as 22hs e flagrar um casal retornando de um jantar de gala. No Brasil, transporte público é coisa de quem não tem outra alternativa. Uma parcela insignificante da população recorre ao transporte público se tem outro meio de se locomover. O pouco serviço que existe não atende a demanda, os veículos são sujos, operam em condições precárias de segurança, isso tudo para não falar da insegurança pública que os ronda!
No caso do IPT, que comentei no início desse texto: estamos falando aqui de um dos poucos centros de tecnologia com reconhecimento internacional desse país. Este não estaria padecendo de algum tipo de massificação? Estaria aí vindo alguma solução desastrada para uma das poucas empresas nacionais que não vende apenas "commodities"?
Bom isso tudo é para evidenciar a dificuldade do Brasil em massificar, popularizar o acesso a bens e serviços. Sempre que são minimamente feitos, trazem consigo um efeito colateral brutal: perda de qualidade.
Para atender a essas e muitas outras demandas populares, é necessário muito mais que boa intenção, é preciso gestão séria - a palavra séria aqui vai muito além do "trabalhar duro" - vai mais no sentido de "trabalhar pelo todo", de "ser mais comprometido com a comunidade, principalmente quando para isso seja necessário abrir mão de vantagens localizadas", significa aprovar um projeto de lei porque o mesmo será benéfico para a sociedade, e não porque ele vai dar fama e crédito ao partido "A" ou "B". O Congresso Nacional, o Senado e o próprio Poder Executivo deveriam trabalhar de forma mais alinhada com a sociedade e menos atenta a aprovações condicionadas a cargos em ministérios e autarquias públicas.
Do nosso lado, cabe exigirmos mais; sermos mais incomodados, inconformados com essa situação que embora venha mostrando sinais de que está rumando a administrações cada vez mais sérias, caminha a passos de tartaruga.
Do contrário, o título desse texto que é o slogan da atual gestão presidencial, para refletir a realidade do nosso país por mais tempo ainda deveria ser mudado para: "Brasil, um país para poucos."
É isso aí pessoal, até mais.
João Arantes é engenheiro, tem 31 anos.
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